quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Detento paga propina a diretor com cartão de crédito

Corrupção em presídio no Rio Grande do Norte: nota fiscal emitida em nome do diretor do presídio 
No Rio Grande do Norte, promotores denunciam por corrupção dois agentes que comandaram a penitenciária Rogério Coutinho Madruga. Presos compravam direito de trabalhar fora da cela e de circular fora do presídio
Na calamitosa situação dos presídios brasileiros, os casos de corrupção entre detentos e servidores da "banda podre" repetem-se em quantidade e variedade inimagináveis. Por vezes, no entanto, a venda de benefícios encontra caminhos surpreendentes até para os mais experimentados investigadores. Um desses casos espantosos é, no momento, alvo do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte, e ocorre exatamente na unidade prisional onde, nesta segunda-feira, presos deflagraram um motim. Uma denúncia oferecida no último dia 15, embasada em documentos e depoimentos, mostra que um detento pagou propina usando um cartão de crédito, parcelando o débito em dez vezes. A situação escabrosa ocorreu no presídio Rogério Coutinho Madruga, unidade da Penitenciária Estadual de Alcaçuz, em Nísia Floresta, cidade da Grande Natal.
Um grupo de promotores que atua em conjunto, para evitar represálias dos detentos e dos agentes envolvidos no crime, descobriu que o preso Walker A. da Silva usou seu cartão de crédito, de bandeira Visa, para comprar, a pedido do então diretor Alexandre Medeiros de Assis, em 2 de setembro de 2013, uma bomba d’água e equipamentos para reparos na própria unidade, no valor total de 815 reais. O comprovante de pagamento, com número do cupom fiscal, bem como a nota da compra emitida em nome do diretor, estão anexados à denúncia.
A penitenciária de Alcaçuz recebeu a visita do ministro Joaquim Barbosa em abril do ano passado. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) ficou chocado com a situação degradante dos detentos. Depois da visita de Barbosa, a relação promíscua entre diretores e quadrilhas não se abalou.
Como explicam os promotores, o dinheiro da bomba d’água é uma ínfima parcela do que estava em jogo entre os encarcerados e os agentes concursados. Na denúncia apresentada à Justiça a compra da bomba aparece como pagamento para que Walker e outros comparsas circulassem livremente fora da prisão. O MP detalha ainda que outro preso, José Welton de Assis, também pagava propina ao diretor para trabalhar fora de seu cubículo. Depoimentos e comprovantes de depósito mostram o pagamento feito por Welton a dois ex-diretores de presídio, para que pudesse trabalhar e ser transferido para o Estado de Sergipe.
A Alexandre Medeiros de Assis, diz a denúncia, Welton pagou 10.000, em parcelas de 1.000 semanais, em troca do direito de trabalhar fora da cela. Outro ex-diretor, Adalberto Luiz Avelino, cobrou e recebeu 15.000 reais para levar o preso para Sergipe.
Depoimentos de parentes de um detento comprovaram, segundo os promotores, que Assis, no período em que esteve no exercício da função, ao longo de 2013, “solicitou diuturnamente vantagens patrimoniais criminosas” a um dos presos (Welton). Os quatro promotores que assinam a denúncia referente a Assis pedem a condenação por corrupção passiva e querem o afastamento imediato do servidor das funções de agente penitenciário, para que não haja risco de o acusado interferir no andamento do processo. Apesar de afastado da unidade alvo da investigação, ele continua trabalhando. Segundo o MP, o diretor cobrou de José Welton a quantia de 50.000 reais. Este seria o valor para coloca-lo em regime de prisão domiciliar. Nesse caso, o valor não chegou a ser pago – ou não foram encontradas provas disso. Para o agente público que cobrou a propina, no entanto, não faz diferença. Como ressaltam os promotores, “o delito já se encontra aperfeiçoado com a simples solicitação da importância, sendo desnecessária a efetiva entrega da vantagem indevida”.
Por Leslie Leitão

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