quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Militares e habeas corpus: inconstitucionalidade do art. 142, § 2º, da CF



A Carta Magna limita o emprego do remédio constitucional nos casos de punições disciplinares militares. O desconhecimento do emprego do habeas corpus nas punições disciplinares militares é oriundo da interpretação literal do artigo 142 parágrafo 2º da Constituição Federal, que integra o capítulo II, da Seção III, do Título V, e trata da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas segundo o qual, "não caberá habeas corpus em relação a punições disciplinares militares", vedando, portanto, a concessão do "writ" em relação às punições disciplinares nos quartéis. No entanto, essa interpretação deve ser vista de forma relativa, uma vez que, esse dispositivo, quando é interpretado de forma absoluta, gera divergências entre os doutrinadores e na própria jurisprudência. Reza a Carta Maior, em seu artigo 5º, inciso LXI, que ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei. Para alguns doutrinadores, a parte final desse dispositivo não deixa margem às dúvidas, quando rege que as transgressões e os crimes militares deverão ser definidos em lei.
Com base nesse entendimento, as punições disciplinares restritivas de liberdade, somente podem ser impostas, quando suas transgressões estiverem definidas em lei. Aí está o problema, pois as transgressões disciplinares estão previstas nos regulamentos disciplinares que foram aprovados por decretos e não por lei, contrariando o dispositivo constitucional que declara que somente através de definição em lei pode-se aplicar pena restritiva de liberdade. Portanto, o fato de serem definidas pelos regulamentos e não em leis específicas faz com que tais punições restritivas de liberdade, baseadas nos regulamentos disciplinares, podem ser anuladas pelo Poder Judiciário. O habeas corpus, por emanar diretamente da Constituição Federal, tem status de norma constitucional, e assim passou a ser desde 1891, com sua introdução no texto da carta republicana. A Constituição em vigor (1988, art. 5º, LXVIII), assim trata do instituto: “conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”. No Brasil, o militar (federal ou estadual) que sofra abuso ou ilegalidade no seu direito de ir e vir, decorrente de prisão pela prática em tese de transgressão disciplinar militar, poderá propor perante o Tribunal militar competente ação constitucional de habeas corpus inclusive com pedido de concessão de medida cautelar. A hierarquia e a disciplina devem ser preservadas por serem princípios essenciais das Corporações Militares, mas os direitos e garantias fundamentais previstos no art. 5º, da CF, são normas de aplicação imediata (art. 5.º, § 1.º, da CF), que devem ser asseguradas a todos os cidadãos (civil ou militar, brasileiro ou estrangeiro), sem qualquer distinção na busca do fortalecimento do Estado de Direito, que foi escolhido pela República Federativa do Brasil, art. 1.º, da CF.

Por: José Cardoso de Araújo Júnior

Um comentário:

  1. Alguns questionam o fato de muitos militares usarem do anonimato para divulgar sua opinião, como se fosse apenas uma questão de covardia por parte deles. Eles sabem muito bem as consequências que expressar-se contra as FFAA podem acarretar para os militares. Alguns exporiam seus nomes e graduações tranquilamente, se não houvesse membros dos setores de inteligência monitorando esses dados para depois realizar “caça as bruxas” nos quartéis. Acredito que é muito fácil dizer nome e patente para defender a Força, mas quando o texto tem conteúdo de crítica, e se houvesse a garantia de que nada aconteceria na esfera disciplinar, tenho certeza que os militares se identificariam.

    ResponderExcluir