Existem
diversas interpretações para a passagem bíblica que você nos propõe:
1ª) Para alguns estudiosos, o trecho de Gênese 6,1-4 poderia ter origem
mitológica, ou seja, foi meramente transcrito pelo Autor Sagrado, sem
indicação da fonte pagã. Assim fazendo, estaria o hagiógrafo salientando
que o mundo ia de mal a pior e precisava da intervenção de Deus,
culminando no Dilúvio.
Os defensores desta interpretação entendem que os "filhos de Deus"
seriam originalmente, segundo essa fonte extrabíblica, deuses que se
uniram às "filhas dos homens" (=mulheres). Os católicos não aceitam esta
interpretação mitológica, que entende "deuses" como "filhos de Deus".
2ª) Os cristãos primitivos, fazendo eco a uma tradição rabínica,
interpretaram os "filhos de Deus" como anjos que teriam se unido às
"filhas dos homens", gerando descendentes gigantes. Isso parece ser
referenciado por Judas 1,6 e 2Pedro 2,4, embora tais passagens não
abonem esse modo de interpretação.
Porém, muito cedo, a partir do século IV, se levantaram entendimentos
contrários de autores cristãos, até porque, sendo seres espirituais, sem
corpo material, não teriam com manter cópula carn
al com as mulheres... 3ª) A última interpretação - que parece ser a mais correta - vê nos "filhos de Deus" os descendentes de Set (uma população fiel ao Senhor) e, nas "filhas dos homens", os descendentes de Caim (uma população infiel). O resultado dessa união seria os "gigantes" (em hebraico: "nefilim"; em grego: "gigas"), o que pode expressar um elemento da mitologia dos povos pagãos primitivos que existiram nas circunvizinhanças (enaquim, enim, refaim, zonzomin), tidos como de alta estatura e realizadores de diversos monumentos megalíticos. Aliás, provêm dos primitivos povos ugaríticos textos que apresentam gigantes mitológicos (os "refaim") como heróis míticos e fundadores de dinastias. Ora, diversas passagens do Antigo Testamento demonstram que os hebreus acreditavam na existência dos povos de altíssima estatura, ao mesmo tempo fortes, soberbos e revoltados contra Deus: Números 13,3; Deuteronômio 2,20-21; 3,11; 1Samuel 17,4; 1Crônicas 11,23; etc. Também encontramos referências a esses "gigantes" nos livros deuterocanônicos (que os protestantes, costumam a chamar de "apócrifos"): Eclesiástico 16,7; Judite 16,6 e Sabedoria 14,6. Para que você tenha uma idéia da altíssima estatura destes "gigantes", em Deuteronômio 3,11 diz-se Og, um remanescente dos "refaim", tinha uma cama de ferro que media 9 côvados de comprimento, o que equivale a 4 metros!!! Esta última interpretação é também favorecida pelo fato de o antiquíssimo tratado rabínico Bereshitrabba 26,7 afirmar que "refaim" é o nome primitivo dado ao "nefilim", heróis primitivos, nascidos de mulheres engravidadas pelos "filhos dos deuses" (observe o traço mitológico!!!). Diante disto, é bem possível que os israelitas tenham preferido usar a palavra "nefilim" para designar os "refaim" da mitologia pagã. Tal substituição de palavras, entretanto, não é de se estranhar. Em 1Crônicas 8,33, por exemplo, vemos que Saul gerou Esbaal (o que significa "homem de Baal"); porém, como este nome tinha conotação pagã, vemos o autor de 1Samuel 14,49 vertê-lo para Isvi (ou seja, "homem de Javé")! Em resumo: a interpretação mais provável para Gênese 6,1-4 é que da união entre o povo descendente de Set (=filhos de Deus) e o povo descendente de Caim (=filhas dos homens) surgiu o povo dos "refaim", que tinha como principal característica sua alta estatura, decorrente talvez de algum problema de ordem genética. E da mesma forma como os bons costumam a se corromper andando na companhia dos maus, desta união resultou a crescente corrupção da espécie humana. É assim que os Padres e Escritores eclesiásticos têm entendido esse difícil texto desde o séc. IV.
al com as mulheres... 3ª) A última interpretação - que parece ser a mais correta - vê nos "filhos de Deus" os descendentes de Set (uma população fiel ao Senhor) e, nas "filhas dos homens", os descendentes de Caim (uma população infiel). O resultado dessa união seria os "gigantes" (em hebraico: "nefilim"; em grego: "gigas"), o que pode expressar um elemento da mitologia dos povos pagãos primitivos que existiram nas circunvizinhanças (enaquim, enim, refaim, zonzomin), tidos como de alta estatura e realizadores de diversos monumentos megalíticos. Aliás, provêm dos primitivos povos ugaríticos textos que apresentam gigantes mitológicos (os "refaim") como heróis míticos e fundadores de dinastias. Ora, diversas passagens do Antigo Testamento demonstram que os hebreus acreditavam na existência dos povos de altíssima estatura, ao mesmo tempo fortes, soberbos e revoltados contra Deus: Números 13,3; Deuteronômio 2,20-21; 3,11; 1Samuel 17,4; 1Crônicas 11,23; etc. Também encontramos referências a esses "gigantes" nos livros deuterocanônicos (que os protestantes, costumam a chamar de "apócrifos"): Eclesiástico 16,7; Judite 16,6 e Sabedoria 14,6. Para que você tenha uma idéia da altíssima estatura destes "gigantes", em Deuteronômio 3,11 diz-se Og, um remanescente dos "refaim", tinha uma cama de ferro que media 9 côvados de comprimento, o que equivale a 4 metros!!! Esta última interpretação é também favorecida pelo fato de o antiquíssimo tratado rabínico Bereshitrabba 26,7 afirmar que "refaim" é o nome primitivo dado ao "nefilim", heróis primitivos, nascidos de mulheres engravidadas pelos "filhos dos deuses" (observe o traço mitológico!!!). Diante disto, é bem possível que os israelitas tenham preferido usar a palavra "nefilim" para designar os "refaim" da mitologia pagã. Tal substituição de palavras, entretanto, não é de se estranhar. Em 1Crônicas 8,33, por exemplo, vemos que Saul gerou Esbaal (o que significa "homem de Baal"); porém, como este nome tinha conotação pagã, vemos o autor de 1Samuel 14,49 vertê-lo para Isvi (ou seja, "homem de Javé")! Em resumo: a interpretação mais provável para Gênese 6,1-4 é que da união entre o povo descendente de Set (=filhos de Deus) e o povo descendente de Caim (=filhas dos homens) surgiu o povo dos "refaim", que tinha como principal característica sua alta estatura, decorrente talvez de algum problema de ordem genética. E da mesma forma como os bons costumam a se corromper andando na companhia dos maus, desta união resultou a crescente corrupção da espécie humana. É assim que os Padres e Escritores eclesiásticos têm entendido esse difícil texto desde o séc. IV.
Por Júnior Cardoso: Teólogo e acadêmico de Direito
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